Como é que o gosto pela moda entrou na sua vida?
Quando entrei no ensino secundário não tinha muito acompanhamento. Na altura, não existia quem nos orientasse, havia apenas o psicólogo. Penso que se tivesse seguido Artes, há 20 anos, as coisas tinham sido muito mais fáceis, ou talvez não. Acabei por seguir Ciências, fui atrás dos meus amigos. Aos 18 anos percebi que não era aquilo. Tive, então, a oportunidade de ir para a Suíça, tinha lá a minha irmã. Foi o meu bilhete para a liberdade. Foi assim que comecei.
Deixei a minha mãe sozinha, que acabou por me originar um sentimento de culpa, apesar de ter sido bom para os dois continuarmos a crescer, independentes um do outro. Parti sem saber quase nada da vida, bati muitas vezes com a cabeça, devido à minha teimosia e ao pensar que sabia muito, quando não era o caso. Não tinha experiência, nunca tinha viajado. Comecei por ajudar a minha irmã em casa, depois tive a oportunidade de fazer um Au Pair, que consistiu em trabalhar com uma família suíça. Devido a algumas circunstâncias, decidi romper com o contrato. Voltei a Portugal. Um mês, depois recebi uma chamada da minha irmã, tinha-me arranjado um trabalho num restaurante. Regressei. Aprendi a fazer pizas, passei por inúmeras experiências e tive uma pessoa fundamental no meu crescimento, o meu patrão na altura. Eu apareci no último ano da vida dele. Dava-me muitos sermões, porque eu era distraído. Durante muitos meses, chorei todos os dias. Acabei, no final, por perceber que este homem foi importante na minha vida porque me fez entender a realidade nua e crua.
Depois, tive outras tantas experiências, às vezes menos boas. Trabalhei em bares, tive contacto com drogas, que acabaram também por me destruir. Foram dívidas, questões de saúde, ..., chatices. Se calhar, sem estas experiências, não saberia o que é o mundo. Quem me deu sempre a mão foi a minha irmã. Acabei por arranjar outro trabalho, numa empresa de genéricos. Aprendi alemão e viajei bastante por Nova Iorque, Paris, ... Após cinco anos, tive uma relação difícil, que me afetou bastante. O meu escape, na altura, foi começar a pintar quadros. Já sem espaço para tantos quadros em casa, arranjei uma galeria para expor o meu trabalho. Se vendesse tudo apanhava um avião e ia para Nova Iorque. Assim foi. Na semana seguinte estava a caminho. Uma vez lá, foi outra aprendizagem. Foi bom. Sem essa realidade não teria entrado no mundo da maquilhagem. Após dez meses, regressei à Suíça e comecei um curso de maquilhagem. Quando terminei, fui trabalhar para a Mac Cosmetics, durante quase um ano. Como vendia bem, começaram a cortar-me a veia criativa. Não estando lá com o intuito apenas de vender, mas sim de aprender, saí. Comecei a fazer maquilhagem para revistas e sessões fotográficas. Estava com 28 anos quando procurei escolas de moda. Estudei três anos numa em Zurique.
Sempre se sentiu um artista?
Sempre. Não tive foi a direção certa aos 17 anos, altura em que tinha de escolher o que que queria seguir. Se tivesse escolhido Artes teria sido diferente. Nunca tive tanta certeza na minha vida de que estou no caminho certo, finalmente.
O que o cativa no universo da moda?
Não estar limitado, é fundamental fazer o que eu quiser.
Em que altura é que percebeu que era na moda que se sentia realizado?
Quando fui viver para Paris. Não era apenas um sonho, mas também um objetivo. Se calhar, foi no dia em que conheci os escritórios da Balmain. Entrei clandestinamente, como se lá trabalhasse. Acabei por falar com uma pessoa dentro das instalações que me tentou ajudar.
Já viajou bastante. Traz alguma inspiração dessas viagens para as suas criações?
Um bocado. Mas as minhas irmãs sempre foram uma fonte de inspiração. Havia sempre vestidos, maquilhagem, ... Uma vez roubei um vestido à minha irmã Sandra e aquilo fez-me feliz. Desde aí que as lantejoulas sempre tiveram na minha cabeça.
"O homem que sou tem muito a ver com a força das mulheres que existem na minha vida”